terça-feira, 5 de junho de 2007

POR UMA PEDAGOGIA INCENDIANTE OU INCENDIÁRIA!

Marcelo Cunha Bueno

A Escola é um campo de batalhas, de lutas discursivas, de guerras pedagógicas. Não pode ser diferente! Um espaço rico geograficamente, onde múltiplos interesses travam confrontos formativos e desejantes por se transformarem em conhecimentos. Essa luta não fere ninguém, não pretende eliminar, aniquilar, apenas quer a desconstrução, a efetivação de novos espaços para conceitos, palavras. Ela quer ensinar a criança, o adulto a desaprender. Desaprendemos quando aquilo que sabíamos perde espaço para o novo. Escola é espaço de ruptura!
Penso naquelas escolas onde tudo é previsto, antecipado, onde não há espaços para as surpresas, para a novidade. O imprevisível, o campo do desconhecido, do incerto e inseguro é fortemente negado por muitas escolas. Devemos lembrar que, sem o espaço para o incerto, não há a menor possibilidade de nos abrirmos para a multiplicação de saberes. Talvez nos forçar a dizer mais “nãos” seria a solução: não ao programa, não aos projetos anuais, não ao cronograma que engessa, emperra e delimita o trabalho de professores e de seus estudantes. A segurança do conteúdo programático é falsa! Falsa porque não consegue controlar o nosso pensamento... que alça vôos. O programa assegura um mesmo discurso, sempre, mas não assegura um aprendizado, nunca!
Negar esses aspectos não é, em nenhuma instância, a defesa da bagunça, mas uma defesa pela escola livre de amarras antigas e ultrapassadas, apregoadas por pedagogias que não querem saber das diferenças, das singularidades, das multiplicidades. Afirmar que queremos liberdades de expressões é poder falar em diversas línguas que o imprevisto é bem-vindo, que a dor não se educa, que os problemas não estão nos outros e sim nas relações, que os conteúdos não precisam ser lineares, que não temos certeza de nada, nem podemos assegurar de como será o dia de amanhã para nossos estudantes. É tirar das costas um “peso histórico” que colocaram para a profissão de educadores!
A Escola é uma instituição em chamas! Diversos focos de incêndios podem ser notados em salas de aula, nas relações entre famílias e professores, professores e estudantes, currículo, discursos, etc. O dia-a-dia escolar é como um vento que propaga as labaredas, queimando a vegetação rasteira existente em cada espaço desse terreno. É por isso que é um espaço que tem vida própria, um espaço que precisa constantemente se compor e se decompor. O fogo que queima na Escola é fogo de paixão, aquela paixão que nos faz padecer, arder, que incomoda, enjoa, deixa sem fome... “amor em brasa”. Paixão que nos desloca, nos coloca em lugares nunca pisados ou sentidos.
A Escola e seus corpos devem se responsabilizar por causar incômodo em seus habitantes para que estes não deixem de querer encontrar rotas de fuga, escapes. Devem fazer com que nos embrenhemos nas labaredas presentes nas relações entre escola e famílias, incendiando as questões trazidas pelas mesmas com um discurso pedagógico (não pedagogizante) voltado às questões escolares.
Não devemos deixar esse fogo se apagar, mas sim colocar mais lenha na fogueira, jogar mais folhas secas, fazer o ar circular para deixar o fogo queimar... É urgente termos mais espaços de formação, de estudos dentro dos espaços escolares! Temos de incorporar o papel caloroso da formação para transformarmos chispas em calor formativo, em paixão!
Uma Pedagogia por Incêndios seria como um grito que se desloca no meio de tanta fumaça e nos faz pensar que, dentro da Escola, há efetivamente um discurso que não precisa de formas para existir, que não se encontra em um lugar definido, pois ecoa em várias direções e sentidos, e que não pretende nos guiar, apenas nos fazer presentes ao escutá-lo.